Um dos temas mais interessantes e complexos do Espiritismo é o das
colônias espirituais. É um assunto que antecede o Espiritismo em milhares
de anos, mas que ganhou uma amplitude inédita após as narrativas do livro
“Nosso lar”.
O conceito de que nosso mundo é composto por várias e diferentes
camadas de realidades não é novo. As mais antigas civilizações do planeta
já se referiram a isso de diversas maneiras, com descrições que variavam
de acordo com as crenças e as culturas que as elaboraram.
Da mesma forma, também foram diferentes as maneiras pelas
quais as descrições de outros planos de existência chegaram até os
encarnados: visões, revelações, sonhos, êxtases, encontros com entidades
superiores, psicografias, canalizações. Os meios mudam, mas muitas vezes as
descrições têm muito em comum.
No Espiritismo, as descrições das colônias espirituais – tais
como a mais conhecidas de todas, “Nosso Lar” – têm lugar de destaque em
muitas obras, sendo fornecidas pelos Espíritos para os médiuns.
O conhecido divulgador da Doutrina Espírita e autor Richard
Simonetti concorda que essa realidade espiritual envolvendo colônias, cidades
ou moradias, está presente nas informações prestadas por médiuns em todas
as culturas.
Mas, ele diz, sempre de forma nebulosa e fantasiosa. Nunca de forma
tão clara e precisa quantos nos ofereceu André Luiz, pela incomparável
mediunidade de Chico Xavier.
Marcel Mariano, vice-presidente da FEEB (Federação Espírita do
Estado da Bahia), também destaca a importância da obra “Nosso Lar” (1944,
FEB). Ele diz que devemos entender as colônias espirituais como os
aglomerados urbanos situados fora do plano material no qual se encontram
os encarnados.
Esses núcleos estão para os espíritos desencarnados como as grandes
cidades estão para nós. Sempre ouvimos essa ou aquela referência a essas
colônias, até porque quem nelas esteve e morou quando na erraticidade traz
vaga lembrança, desejoso de para ela voltar quando da desencarnação.
Alguns livros do século 19, de natureza mediúnica, já se
referiam a tais adensamentos de seres desvestidos do corpo, mas foi tão
somente com a obra de “Nosso Lar”, de autoria espiritual de André Luiz, pelo
médium Chico Xavier, que o assunto ganhou uma dimensão doutrinária em nosso
movimento.
Allan Kardec a elas se referiu sutilmente, conforme se pode observar
pela questão proposta por ele aos Espíritos Codificadores, na questão 234
de “O Livro dos Espíritos”. O dirigente baiano também disse que existe
diferença entre as colônias espirituais citadas no Espiritismo e cidades
espirituais semelhantes mencionadas por outras doutrinas ou religiões.
A diferença existe, diz Mariano, e gira em torno do desdobramento,
de onde esta se situa, e como funciona, o que foi feito magistralmente por
André Luiz na obra já referida. As muitas citações deixam claro que elas
existem, diferindo apenas pelo canal por onde vazam esses informes, que podem
ser genéricos ou específicos.
Na questão 234 de “O Livro dos Espíritos”, à qual Marcel Mariano se
referiu, Kardec pergunta se existem de fato mundos que servem de estações ou
pontos de repouso aos Espíritos errantes. A resposta é que eles existem,
mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que podem
servir-lhes de habitação temporária, campos nos quais possam descansar de
uma erraticidade demasiada longa.
São, entre os outros mundos, posições intermediárias, graduadas de
acordo com a natureza dos Espíritos que a elas podem ter acesso e onde eles
gozam de maior ou menor bem-estar.
O pesquisador, escritor e médium Eurípedes Kuhl entende que pode
haver alguma semelhança entre as cidades citadas pelo Espiritismo e aquelas,
por exemplo, da Grande Fraternidade Branca. Não posso afirmar categoricamente
que as colônias espirituais citadas na literatura espírita sejam as mesmas
referidas em outras fontes, diz Kuhl.
No entanto, nada me objeta refletir e deduzir que sim, de
alguma forma assemelham-se, em parte, como a citação de esferas (degraus)
espirituais, na psicosfera terrena, nas quais habitam espíritos bons e maus.
As diferenças existentes decorrem da diversidade, não só da
forma de expressão humana para registrar acontecimentos, quase sempre eivada de
animismo, mas principalmente em razão da cultura dos diversos povos, ao
longo da história, além dos fundamentos de cada corrente do pensamento
religioso.
Via de regra proclamando existência terrena única e “juízo final”,
ao passo que a Doutrina dos Espíritos, e não apenas ela, professa a
reencarnação – vidas sucessivas – como forma individual (por
merecimento) de alcançar o progresso moral e a felicidade.
Baseando-se no livro “Colônias Espirituais”, de Lúcia Loureiro,
Eurípedes levanta exemplos na história de referência a colônias espirituais
– também chamadas cidades ou moradas espirituais, entre outras
designações.
Os Egípcios (por volta do ano 2100 A.C.) consideravam que os
mortos seriam julgados diante de Osíris (deus do mundo infernal e juiz dos
mortos); daí, os bons iriam para locais venturosos e os maus, para lugares
tenebrosos, sem luz e sem alimentos, para sempre. Os Persas (1500 A.C.)
proclamavam mais ou menos as mesmas condições dos egípcios, com a diferença de
que no fim até os maus se salvariam.
Para os Gregos (500 a 400 A.C.), os bons – os deuses – estavam
no Olimpo; quanto aos demais, após a morte haveria um julgamento presidido por
“Hades” (um dos 12 deuses do Olimpo, senhor das profundezas subterrâneas, os
infernos); os bons iriam para os “Campos Elíseos”, mansão dos
bem-aventurados; os ímpios eram atirados ao “Tártaro” (lugar de expiação).
Sócrates e Platão filosofavam (intuíam) que as almas, após
permanecerem por algum tempo no Hades, retornariam à vida
terrena (antecedentes da reencarnação). Jesus declarou sumariamente a
existência de “muitas moradas na Casa do meu Pai”.
Dante Alighieri (1265–1321), de acordo com o pensamento da idade
Média, afirmou, na “Divina Comédia”, que na semana Santa do ano de
1300, desdobrou-se espiritualmente e, após atravessar os nove círculos do
inferno, viu como é a vida no mundo do Além.
Emmanuel Swedenborg (1688-1772), sueco de grande cultura, precursor
do Espiritismo, narrou ter recebido revelações espirituais. Numa
delas, descreveu a visão que teve do mundo espiritual, citando, entre
tantos detalhes, a existência de cidades, palácios, casas, livros, etc.
Eurípedes também se referiu ao fato de Kardec ter tocado levemente
no tema das colônias ou cidades espirituais. Allan Kardec, de fato, foi econômico
quanto a citações referentes a cidades espirituais, diz Kuhl, no entanto,
relacionando ainda outra questão de “O Livro dos Espíritos”, a de número
86, na qual os Espíritos informam claramente que “... é incessante a correlação
entre o mundo espírita (espiritual) e o mundo material.
Segundo Kuhl, infere-se daí que no plano espiritual há cidades
e tudo o mais que temos aqui. “Sem pieguismos, minha ilação é que lá tem
muito mais do que aqui.”
Posteriormente, segundo nos explica Eurípedes, Kardec deixou
pequenas notas sobre habitações espirituais. Por exemplo, na “Revista
Espírita”, de agosto de 1868, refere-se a cidades na espiritualidade, com
comentários sobre habitações em Júpiter, com moradas e edifícios para varias
finalidades. E em “O Céu e o Inferno”, registra o depoimento do Espírito
da condessa Paula, dando conta das moradas aéreas, iluminadas por cores
sublimes.
Para Simonetti, ainda que não existam descrições detalhadas sobre
colônias espirituais na obra de Kardec, ele não ignorava sua existência, já que
a condição gregária, isto é, a necessidade de conviver para evoluir, é uma
característica do espírito imortal. Não teria sentido imaginá-lo a
viver de forma solitária na espiritualidade. Marcel Mariano entende que
Kardec preocupou-se mais com a situação do Espírito no além do que como o lugar
em que ele estava situado.
O presidente da Funtarso (operadora da Rádio Rio de Janeiro), Gerson
Simões Monteiro, lembra que as revelações dos Espíritos Superiores à humanidade
são graduais e, assim, em 1857 eles não poderiam falar de comunidades de
Espíritos habitando cidades estruturadas em edificações de natureza sólida
na atmosfera terrestre.
Quando estive pessoalmente com Chico Xavier em sua casa em Uberaba,
nos idos de 1980, diz Gerson, ele me contou que quando estava psicografando o
livro “Nosso Lar” foi tachado de “médium fascinado”. Ele mesmo estava
meio confuso com toda aquela situação.
Certa noite, o Espírito André Luiz levou-o em desprendimento
num ponto bem acima da cidade de “Nosso Lar”, para que ele visse de cima a
cidade e pudesse constatar a realidade do que estava psicografando. E,
nesse momento, esclareceu-me ainda que o que ele viu naquela noite está
exatamente no mapa desenhado no livro “Cidade no Além, 1983” pela
médium Heigorina Cunha.
Essa médium comprovou a existência da cidade em desdobramento
espiritual durante o sono, explica Gerson Simões. Ao despertar no
corpo, Heigorina desenhava o que via em suas visitas durante a emancipação
de sua alma ao dormir, retratando jardins, avenidas, prédios e até a planta
baixa da cidade, que abriga cerca de um milhão de espíritos desencarnados.
Esses desenhos estão reunidos no livro “Cidade no Além”.
Com relação a essas colônias, lembra Eurípedes, deve-se considerar
também que os Espíritos que habitam a espiritualidade são agrupados
segundo o grau individual de evolução moral, sintonia, simpatias, objetivos,
habilidades, tendências, hábitos, suas necessidades de aprendizado, de
evolução moral. Assim, é de se imaginar que podem existir colônias espirituais
que reúnam apenas determinados tipos de Espíritos. Podem existir até mesmo
colônias “do mal”.
Espíritos trevosos, portanto infelizes, explica Kuhl, reunidos em
falanges, constroem cidades no mundo espiritual, onde exercem tirania, subjugando
incautos. Como por exemplo, citamos o capítulo II da obra “Libertação”
(1949, FEB), do autor espiritual André Luiz, com psicografia de Chico Xavier.
Ainda, no capítulo XIV a impressionante descrição de uma cidade
espiritual estranha, comandada por infortunado quanto poderoso
governador: naquela cidade residem centenas de milhares de espíritos
alienados e doentes. Construções no mundo espiritual, para o bem ou para o
mal, obedecem ao manejo da vontade e do pensamento do espírito (O livro
dos Médiuns, capítulo VIII e a Gênese, capítulo XIV, item 13).
Marcel Mariano segue pela mesma linha de raciocínio, lembrando a
mesma obra “Libertação”, além de “Sexo e Obsessão” (Leal), de Manoel Miranda
psicografado por Divaldo Franco:
“Entendemos, à luz dos ensinamentos espíritas, que os Espíritos
formam colônias ou aglomerados de convivência no mais além, atraídos pela
afinidade de propósitos, de sentimentos, o que nos leva a admitir a
existência de colônias somente de suicidas, de sexólatras, de toxicômanos, e
por aí vai. E, nessa linha de raciocínio, é igualmente admissível conceber
cidades ou agrupamentos espirituais inteiramente dedicados ao mal”.
Gerson Simões Monteiro acredita que devam existir milhares de
colônias em torno da Terra, cada uma reunindo Espíritos afins, de acordo com a
raça, religião, cultura, progresso moral, etc. “Admitindo-se que em torno da
Terra vivam cerca de 13 bilhões de Espíritos desencarnados, e dividindo por um
milhão, tomando por base a população de “Nosso Lar”, teremos no mínimo 13 mil
colônias espalhadas por toda a psicosfera terráquea”.
Um exemplo que fundamenta o ponto de vista de Gerson é o livro
“Quando se pretende falar da vida” (1984, GEEM), citado por ele. Na obra, “o
jovem de formação israelita Roberto Muszkat, desencarnado em 14 de março de
1979, enviou 22 mensagens pelo médium Chico Xavier, endereçadas aos seus
pais e familiares. Na mensagem de 16 de novembro de 1979, relatando para a
mãe o seu desligamento do corpo, ele fala da ajuda de seu avô, Moszek Aron, o
qual, ao pronunciar as palavras “leshaná habaá bi-Yerushalayim”,
tranqüilizou-o, fazendo com que dormisse como uma criança”.
Ao acordar, seu avô levou-o ao encontro de outros espíritos amigos
e, numa reunião, teve a oportunidade de fazer muitas perguntas. Foi assim que
ficou sabendo que estava em “Erets Israel” (Terra de Israel), ou Terra do
Renascimento, uma província do espaço terrestre onde se erguia uma cidade
luminosa dos profetas. Ele explicou ainda que não queria dizer que estava numa
cidade privilegiada, uma vez que outras nações também possuem essas cidades nas
esferas que cercam o planeta.
Richard Simonetti também fala em números altos ao imaginar a
quantidade de colônias que podem existir no planeta. Se considerarmos, diz ele,
consoante informações do médium Chico Xavier, que a população global do
planeta é perto de 25 bilhões de espíritos em evolução e que estão
encarnados aproximadamente 6 bilhões e 700 milhões, será fácil concluir que há
incontáveis colônias nos vários níveis espirituais do planeta.
Para Eurípedes Kuhl, são tantas as citações sobre essas colônias que
imagino inviável quantificá-las. Numa comparação tosca, da qual me penitencio,
cito que apenas no Brasil temos mais de cinco mil Municípios, além de uma
infinidade de pequenos povoados, muitos deles sem registro nos mapas.
E no mundo? E quanto à localização dessas colônias, Eurípedes
entende que só pode se saber por dedução. Considerando-se notícias vindas do
Plano Maior, parece-me que, na maioria dos casos, a cada cidade terrena há
uma correspondente espiritual, situada logo acima da respectiva psicosfera.
Já Marcel Mariano entende que “toda informação que indique o lugar
onde uma colônia está situada, quantos habitantes possui, quantas são e como é
sua estrutura político- administrativa, é matéria de fé. Pode ser rejeitada.
Ninguém é obrigado a aceitar como verdade uma informação somente porque ela é
de origem mediúnica. Sob hipótese alguma vou lançar fora o bom senso que deve
presidir meu senso crítico, como nos recomendou Kardec.
Posso aceitar essa ou aquela informação, mas não posso prová-las
materialmente. É o caso de “Nosso Lar”, que aceitamos genericamente em
nosso movimento por estar lastreada pela idoneidade moral de Chico, calcada
numa vida ímpar, de abnegação e desinteresse levados ao extremo em favor do
próximo. Exercitemos a liberdade de pensamento acima de tudo.
Com relação às provas materiais, Eurípedes Kuhl segue pelo mesmo
caminho que Marcel Mariano, entendendo que elas não existem, mas ao mesmo tempo
salientando que as provas espirituais são infinitas, com lastro na fé
raciocinada. Algo assim como um sofisma, ele diz, que me permito: “nunca
fui ao Japão, no entanto tenho certeza absoluta de que a sua capital é Tóquio”.
Simonetti lembra que a prova está no que Kardec chamava de
universalidade dos ensinos. Se, por intermédio de vários médiuns confiáveis,
diz Simonetti, recebemos notícias idênticas sobre o assunto, temos aí a
evidência de que existem colônias espirituais. Obviamente, é uma prova para
quem a aceita. Até hoje há quem não aceite as evidências de que os americanos
foram à Lua e, na Inglaterra, há uma sociedade cujos membros não acreditam
que a Terra é redonda.
Marcel Mariano lembra que fotos obtidas pelo sistema VIDICOM já
estão trazendo aspectos de residências e de abrigos no mundo espiritual. Essa
palavra foi criada pelo pesquisador Klaus Schreiber, ao que se sabe em 1985,
quando ele idealizou um sistema de comunicação com o mundo dos espíritos ou
transcomunicação instrumental, com vídeo.
Consistia basicamente numa câmera em um tripé filmando a tela de uma
televisão, sintonizada num canal sem imagens. Ou seja, filmava-se o “chuvisco”
e, posteriormente, o filme era passado em velocidades menores; em alguns casos,
são detectadas imagens.
Aguardemos, diz Marcel, que esta área da ciência experimental avance
um pouco mais e nos traga confirmação desses informes de natureza mediúnica,
sobretudo pela psicografia. Até lá, poderemos até acreditar, mas somente
saberemos com o aval da ciência.
Gerson Simões Monteiro lembra que, se Allan Kardec precisasse
da confirmação da ciência sobre a existência da alma ou da reencarnação para
publicar “O Livro dos Espíritos”, estaríamos esperando o pronunciamento oficial
até hoje. Não podemos perder de vista o aspecto revelador do Espiritismo,
ele explica, que se antecipou ao conhecimento humano a respeito da existência
da alma, da reencarnação, até mesmo a do perispírito.
Um exemplo dessa antecipação propiciada pelo aspecto revelador do
Espiritismo, segundo apresenta Gerson, é ocaso da existência de água no
solo de Marte. Desde 1939, ele explica, o espírito “Humberto de Campos”, pelo
médium Chico Xavier, no livro “Novas Mensagens”, fala dessa existência. No
entanto, somente em 2004, ou seja, 65 anos após a publicação da obra, a NASA
apresentou as primeiras provas químicas e geológicas diretas da existência de
água no passado.
Agora, em 31 de julho de 2008, com a sonda Phoenix, o cientista
William Boynton, da Universidade do Arizona, declarou que eles tinham evidência
de gelo. Se para “tocar” em coisas materiais, a ciência humana levou mais
de 60 anos, o que dirá para “tocar” coisas da dimensão espiritual, no
caso, as colônias espirituais, como também chegar à conclusão de que a alma existe
e que ela reencarna várias vezes?
É preciso lembrar que Allan Kardec, em “A Gênese”, ao tratar dos
Caracteres da Revelação Espírita, esclarece: “A revelação Espírita, por
sua natureza, tem uma dupla característica: é ao mesmo tempo uma revelação
Divina e uma revelação científica”. Portanto, o ônus da prova das revelações
feitas pelos Espiritismo cabe à ciência humana, e não ao Espiritismo”.
Gilberto Schoereder
Revista Espiritismo e Ciência
Nenhum comentário:
Postar um comentário