“Alguém nos questionou se se usar uma tatuagem
na pele teria influência sobre o perispírito”. Há dirigentes de casas espíritas
advertindo que todas as pessoas que fizeram ou pensam em gravar tatuagens ou
usar piercings, automaticamente estarão em processo de obsessão. Alguns
cristãos baseiam-se nas Antigas Escrituras, onde encontramos advertência aos
israelitas de "que não deveriam marcar o corpo, fazer cicatrizes com
açoites como autoflagelo, por nenhum motivo.”. (1)
Conhecemos líderes espíritas convictos de que
pessoas que tatuam o corpo inteiro ou o enchem de piercings são espíritos
primários que ainda carregam lembranças intensas de experiências pretéritas,
sobretudo dos tempos dos bárbaros, quando belicosos e cruéis serviam-se dessas
marcas na pele para se impor ante os adversários.
Positivamente não identificamos pontos de
caráter prático no uso de tatuagens, especialmente se a lesão imposta ao
próprio corpo for por mero capricho. Isso sim refletirá invariavelmente no
perispírito, já que, sendo o corpo físico (templo da alma) um consentimento
divino para nossas provas e expiações, devemos mantê-lo dignamente protegido e
saudável. Entretanto, será que o uso de piercings e tatuagens sobrepujam
qualidades morais? Quem pode penetrar na intimidade do semelhante e saber o que
aí ocorre?
Sob a percepção histórica, a tatuagem é uma
técnica ancestral que se esvai na memória cultural das civilizações.
Antigamente eram aplicadas para marcar o corpo de um escravo com o símbolo do
proprietário. Gravavam-se os corpos das prostitutas com o emblema de um reino,
governo ou estado. Servia também para estigmatizar o corpo da mulher adúltera.
Ainda hoje é tradição o seu uso no corpo de príncipes de tribos beduínas,
africanas e das ilhas do pacífico. Presentemente, servem para marcar o corpo de
membros de gangues, grupos de atletas esportistas (surfe, motociclismo),
"beatniks" (movimento sociocultural nos anos 50 e princípios dos anos
60 que subscreveram um estilo de vida antimaterialista, na sequência da 2.ª
Guerra Mundial.), hippies, roqueiros e alastrados principalmente entre jovens
comuns dos dias de hoje.
Os que se tatuam devem procurar identificar
seus motivos íntimos. Recordemos que o corpo é o templo do Espírito e não nos
pertence, portanto, é importante preservá-lo contra agressões que possam
mutilar a sua composição natural. Há os que usam vários brincos, piercings e outros
adereços. Haveria a mutilação espiritual por causa desses apetrechos? Talvez
sim, provavelmente não! O certo é que o perispírito é efetivamente lesado pela
defecção moral, desequilíbrio emocional que leva a suicídios diretos e indiretos;
vícios físicos e mentais, rancores, pessimismos, ambição, vaidade desmesurada,
luxúria.
Esfola-se o corpo espiritual todas as vezes que
se prejudica o semelhante através da maledicência, da agressividade, da
violência de todos os níveis, da perfídia. Destarte, analisado por esse prisma,
os adereços afetam menos o corpo perispirítico. Principalmente porque na atualidade
muitos desses adornos que ferem o corpo físico podem ser revertidos, já na
atual encanação, e naturalmente não repercutirá no tecido perispiritual.
André Luiz elucida que o perispírito não
é reflexo do corpo físico; este é que reflete a alma. "As lesões do corpo
físico só terão, pois, repercussão no corpo espiritual se houver fixação mental
do indivíduo diante do acontecido ou se o ato praticado estiver em desacordo
com as leis que regem a vida.”. (2) As tatuagens e as pequenas mutilações que
alguns indivíduos elaboram como forma de demonstrar amor a exemplo de alguém
que grava o nome do pai ou da mãe no corpo de modo discreto não trariam,
logicamente, os mesmos efeitos que ocorreriam com aqueles que se tatuam de modo
resoluto, movimentados por anseios mais grosseiros.
Curiosamente, muitas pessoas, retornando ao
plano espiritual, podem optar pelo uso dos adornos aqui discutidos. Segundo o
autor do livro Nosso Lar, "os desencarnados podem, sob o ponto de vista
fluídico, moldar mentalmente e de maneira automática, no mundo dos Espíritos,
roupas e objetos de uso e gosto pessoal. Destarte, é perfeitamente possível,
embora lamentemos que um ser no além-túmulo permaneça condicionado aos vícios,
modismos e tantas outras coisas frívolas da sociedade terrena.”. (3)
No que concerne às tatuagens especificamente,
por ser um tipo de insígnia permanente, pode, sem dúvida, ocasionar conflitos
mentais. A começar na atual encarnação, quando chega à ocasião em que o tatuado
se arrepende, após ter mudado de ideia, em relação à finalidade da tatuagem.
Concebamos que seja o apelido, sobrenome, o desenho ou algum emblema de alguma
pessoa que já não estima, não ama ou qualquer outra silueta que já não aceita
em seu corpo. Então, o que era um mero enfeite, culmina cansando a estética e
torna-se um problema particular de complexa solução.
Então, por que a pessoa se permite tatuar? Nas
culturas primitivas se usavam tatuagens com finalidades mágicas, para evocar a
interferência de divindades, para o bem ou o mal. Hoje é, para muitos
indivíduos, uma espécie de ritual de passagem, envolvendo a integração num
grupo. Pode ser também de identificação. Pela tatuagem a pessoa está dizendo
algo de si mesma.
Nas estruturas dos códigos espíritas não há
espaços para proibições. Não obstante, a Doutrina dos Espíritos oferece-nos
subsídios para ponderação a fim de que decidamos racionalmente sobre o que,
como, quando, onde fazer ou deixar de fazer (livre-arbítrio). Evidentemente que
não é o uso de tatuagens que retratará a índole e o caráter de alguém. Todavia,
não podemos perder de vista que alguns modelos de tatuagens, com pretextos
sinistros, podem ser classificados (sem anátemas) como censuráveis e
inadequados para um cristão de qualquer linhagem.
Nesse contexto, é importante compreender a
pessoa de forma integral. As características anunciadas no corpo são resultados
de seus estados mentais, reflexos das experiências culturais, aprendizados e
interpretação de mundo. Como dissemos o Espiritismo não proíbe nada e
fornece-nos as explicações para os fenômenos psíquicos. Assim sendo, as
recomendações doutrinárias não combatem, porém conscientizam! Não são
indiferentes aos dramas existenciais e demonstram como edificar e marchar no
mais acautelado caminho.
Dissemos que o uso piercings e outros adereços
e da própria tatuagem por si só não caracteriza alguém com ou sem moralidade.
Investiguemos, porém as causas dessas atitudes. Quais sãos os anseios, os
sonhos, as crenças dos que cobrem seus corpos com tais marcas? Tatuagens,
piercings, são estágios transitórios. Importa alcançar, porém, se tais
indivíduos estão mutilados psíquica, emocional e espiritualmente. O que os
conduz muitas vezes a despedaçar a barreira da ponderação e do juízo? Por que
atentam contra si submetendo-se a dores e sofrimentos incompreensíveis? Para
uns o motivo é o modismo. Outros, todavia, ainda se acham atrelados a costumes
de outras existências físicas e trafegam do mundo inconsciente para o
consciente, derivando na transfiguração do corpo biológico.
Perante questões controversas, as mensagens
kardecianas buscam na intimidade do ser o seu real problema. Convidam-nos ao
autoconhecimento e ao estágio do auto-aprimoramento. Sugere-nos sensatez,
autoestima, altivez, comedimento e a busca incessante de Deus, o Exclusivo
Ente, que facultara-nos completar de contentamento e paz de consciência."
Referências
bibliográficas:(1) Levítico 19.28; Deuteronômio 14.1-2.(2) Xavier, Francisco Cândido
e Vieira , Waldo. Evolução em dois mundos, ditado pelo Espírito André Luiz, Rio
de Janeiro, Ed. FEB, 1959(3) Xavier, Francisco Cândido. Nosso Lar, ditado pelo
Espírito André Luiz, Rio de Janeiro: Ed. FEB, 1955
Jorge Hessen
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