Para onde vamos quando morremos. O que é a morte:
colheita obrigatória de nossa semeadura.
Tudo faz parte da natureza, tanto o “nosso" mundo, isto é, o mundo
físico e visível, quanto o mundo espiritual e invisível aos olhos do corpo
físico. Nada há de sobrenatural. E, mais ainda: poderemos até dizer
que o mundo material - o "nosso" mundo é uma cópia bastante prejudicada
do mundo espiritual. Isto quer dizer que a matriz do mundo material está
no mundo espiritual. O mundo espiritual existe há mais tempo, é o mundo
primitivo em termos cronológicos.
Na realidade, não existem diferenças marcantes, acentuadas, entre o
mundo espiritual e o mundo material. Numa linguagem figurada, poderíamos
até dizer que o mundo material é uma "coagulação", um adensamento, do
mundo espiritual. De outra parte, o mundo espiritual é a quintessência, a
sublimação, do mundo material.
Segundo velhas crenças, quando uma pessoa desencarnava, ao chegar ao
Plano Espiritual passava a ter uma série de virtudes, que jamais possuiu quando
esteve "aqui entre nós". A Doutrina Espírita, porém, ensina que
a morte do corpo físico - a desencarnação - não eleva ninguém à categoria de
santo, dando-lhe poderes que não conquistou com trabalho e dedicação ao próximo
quando encarnado. Ensina que quando desencarnamos continuamos os mesmos,
do ponto de vista moral, já que do ponto de vista físico (ricos e pobres) todos
nos igualamos no Plano Espiritual. O individuo maldoso continuará um
espírito maldoso; o bom será um bom espírito.
Existe, entretanto, muita gente que, quando encarnada, consegue
disfarçar sua verdadeira estatura espiritual. Muitas vezes apresenta-se
como indivíduo bom às claras, porém perverso às escondidas. Quando um
indivíduo desses retornar ao Plano Espiritual apresentar-se-á sem nenhum
disfarce e sofrerá todas as consequências do mal que cometeu e da falsidade que
cultivou.
O espírito evolui, pois a Evolução é uma lei natural. Logo, um
maldoso, assim que desencarna, continua o mesmo indivíduo maldoso, porém, com o
tempo, no Plano Espiritual lhe é proporcionada oportunidade de aprendizado para
aprimoramento, podendo ele mudar suas disposições e inclinar-se para a prática
do bem.
Tomemos, como exemplo, um espírito que se encontre num estado bastante
primitivo, um espírito bastante inferior, consequentemente muito apegado à
matéria, ligado ainda por laços firmes ao mundo material.
Esse espírito desencarna. E, desencarnado, chega ao mundo
espiritual sem saber que desencarnou. Na realidade, ele nem sabe o que se
está passando com ele, pois continua vivo e com toda sua individualidade.
Não percebe a transição do mundo material para o mundo espiritual.
Esse espírito permanece muito próximo da superfície terrestre, naquela
região a que chamamos Crosta. É uma região interdependente com a crosta física
do planeta. Espíritos assim ficam ali apegados, presos, e sofrem muito,
pois têm todas as sensações materiais e, contudo, já não possuem mais o corpo
físico para satisfazer às necessidades produzidas por essas sensações. Às
vezes, encontram-se com outros espíritos dos quais foram inimigos na vida terrena;
travam com eles violentas lutas, como verdadeiros animais disputando preciosas
presas.
Esses indivíduos têm uma vida mesquinha
e materializada, mesmo estando no Plano Espiritual. Ficam às tontas,
vagando no espaço. Muitas vezes são conduzidos logo à reencarnação.
E continuam nada sabendo do que se passou entre a desencarnação e a nova encarnação.
Estão praticamente, equiparados aos animais, que, como se sabe, não têm vida
espiritual.
Tomemos, agora, outro exemplo. Um homem
mais evoluído, que já se aproxima um pouco dos ensinamentos de Jesus.
Embora em estágio bem mais avançado que aquele do exemplo anterior, está,
contudo, muito longe da perfeição. Pratica alguns dos ensinamentos do Evangelho,
todavia seu apego aos bens terrenos, aos gozos materiais, ainda é muito grande.
Esse indivíduo desencarna e vai passar por uma
experiência muito interessante. Essa experiência lhe será dolorosa,
representará uma fase muito dura no caminho de sua evolução. Embora
sabendo-se desencarnado, ele sente-se preso à matéria. Sente vontade de
praticar os vícios que alimentou. Se era um fumante inveterado, um
bebedor contumaz, vai sofrer muito com a falta do fumo e da bebida. Vai
sentir falta do prazer material a que estava habituado.
Espíritos dessa categoria permanecem muitos
anos naquela região chamada Umbral do Plano Espiritual, onde purgarão suas
dependências para com o mundo físico. O Umbral é uma espécie de câmara de
sofrimentos, provocados pela distância em que o espírito se encontra da matéria
e dos prazeres que lhe eram tão importantes quando encarnado. Da falta
desses prazeres é que advém o sofrimento.
Se a passagem pelo Umbral se prolonga
por muito tempo, pode acontecer que o espírito reencarne sem ter tido uma
experiência no plano espiritual. Mas, se for um espírito de certo
equilíbrio, chegando a um tempo em que já se tenha despojado de suas
vinculações mais grosseiras com a matéria, será recolhido a uma Colônia
Espiritual.
Nessa Colônia, o espírito terá acesso a assuntos que, até então, lhe
eram inteiramente desconhecidos. Através de cursos ministrados por espíritos
mais evoluídos, aprenderá novas verdades, enriquecerá seu cabedal de
conhecimentos, ampliará seus horizontes.
Os sofrimentos do Umbral e o aprendizado numa dessas Colônias estão
muito bem relatados no livro "Nosso Lar", de autoria do espírito
André Luiz, psicografado por Francisco Cândido Xavier.
André Luiz era um indivíduo bom quando encarnado. Um homem
correto, bom pai, bom esposo, bom profissional. Mas adorava os prazeres
da mesa. A gula era um de seus vícios. Depois de desencarnado,
passou oito anos no Umbral. Nesse período foi obrigado, pelo sofrimento,
a desvincular-se da mesa lauta. Depois desse estágio depurador, foi
recolhido à Colônia Espiritual "Nosso Lar" onde
começou um processo de reeducação e aprendizado.
No mundo espiritual aprendemos, assumimos novas disposições. Mas
a prática, o testemunho, é aplicado no plano físico, isto é, quando estamos
reencarnados. É no corpo físico, nesta abençoada morada que é o nosso corpo
físico, que aplicamos aquilo que aprendemos no Plano Espiritual, demonstrando
se fomos alunos aplicados ou se temos de repetir o aprendizado.
O sono reparador no limiar da Nova Vida
O Espírito demasiadamente ligado aos interesses
humanos tem necessidade de amplo mergulho na inconsciência, quase total, depois
da morte. Essa é a posição dos seres mais primitivos, os que estão
despreparados para a vida no Além.
Os criminosos e viciados de toda sorte também não se
adaptam às indagações de natureza elevada e têm necessidade do torpor quase
absoluto. Finda a batalha terrena, entram em período de sono pacífico
ou
de pesadelo torturado ( .. ). Esse período varia de acordo com a probabilidade
de reerguimento moral ou de maiores quedas por parte desses espíritos.
Esse período é também chamado de hibernação
da consciência. Depois dele, os desencarnados podem voltar
à carne, ou permanecer em educandários, nos círculos inferiores, para colaborarem
dentro de suas possibilidades.
Com o Espírito de evolução média, dá-se maior
lucidez nas esferas do além-túmulo, e tanto maior será quanto mais e melhor
procurar atender aos desígnios divinos, durante a experiência material.
Assim, quanto mais evoluído é o Espírito,
menos descansa após a morte física. Seu grau de conscientização é maior,
por isso existem almas que se transferem para regiões mais altas da Espiritualidade,
após a morte física, sem necessidade de passar pelo repouso tonificante.
Em Os Mensageiros, André Luiz escreve
sobre pavilhões inteiros com espíritos que dormem profundamente, após a morte,
por anos a fio. Somente em Campos da Paz, Posto de Socorro da
região umbralina, existem cerca de 2.000 deles, em sono profundo. São as
criaturas que nunca se entregaram ao bem ativo e renovador( ..
)
os que acreditaram convictamente na morte, como sendo o nada, o fim
de tudo, o sono eterno.
Todos os que dormem às vezes, por decênios,
entregam-se a pesadelos, a horríveis visões íntimas.
Alguns casos
Angelo Di Sarno - dirigia-se à
cidade de Valinhos, quando, no viaduto de entrada da Rodovia dos Bandeirantes,
acidentou-se com o seu veículo, vindo a falecer aos 25 anos. Em carta dirigida
à sua mãe Rosa, descreveu o acidente e falou da situação estranha de estar
vendo tudo (4):
Os desconhecidos que me rodeavam
lamentavam o meu desconforto, outros queriam ver o
veículo e se puseram a examiná-lo, até que os
agentes da polícia do trânsito chegassem e me
anotassem a posição de imobilidade e falaram em morte, o
que realmente me assustou.
Quis reagir, explicar que eu estava vivo, que decerto as escoriações deviam estar vertendo muito sangue, mas não consegui.
Uma inesperada fraqueza me
assaltou e perdi o controle de mim próprio.
Eu devia estar muito quebrado e ferido, porque não pude
articular palavra.
Não é comum, na desencarnação traumática, o Espírito ter esse grau de
consciência, como ocorreu a Ângelo. Apesar do desastre automobilístico, ele
anotou o que se passava à sua volta. A desencarnação por doença física favorece
mais esses voos conscientes, essa visão mais nítida dos dois corpos já
desligados.
Ângelo Di Sarno - relata:
Então, senti que mãos amigas me carregavam e me puseram dentro de outro
carro, sem que eu pudesse saber, de momento, que era uma ambulância.
Notei vagamente que o carro se pusera em movimento e que me transportavam para
algum lugar.
Uma senhora, falando um harmonioso italiano, convidou-o ao repouso:
Você está cansado e precisa
repousar. Durma pode dormir sem medo(... ) Você será transportado, durante o sono,
para o lugar de nossa moradia. Durma ... Durma!
Dormi pensando que eu ainda teria chance de ir a nossa casa para
abraçá-la e abraçar o Papai Aniello, e os irmãos Giovani e André, mas acordei
numa outra paisagem. Não mais me senti dentro do carro e, sim numa casa
acolhedora cercada por um bonito "giardino". Embora muito fraco,
perguntei quem era aquela senhora que me socorrera no veículo, dirigindo-me a
ela mesma. Ela me disse sorrindo:
- Meu filho, somos tantos corações aqui reunidos que para alcançar a
sua compreensão, direi apenas que sou avó da avó de sua avó Ana Maria e deixei
a Itália há muitos anos.
Vítor Fernando Stocco Júnior – o
Vitinho nasceu dia 13 de fevereiro de 1974 e faleceu aos 15 anos, a 8 de
setembro de 1989. Nesse dia, ele estava em um Clube de Campo, na cidade
de Itapevi (SP) em companhia de casais amigos de sua família e de seus
filhos. Na manhã do dia 8, ao sair da barraca de acampamento, foi
acometido de um mal súbito e caiu, sendo levado a um pronto-socorro próximo ao
Clube, mas já chegou em óbito. Os médicos consideraram como causa
mortis
a ruptura de aneurisma cerebral. Escrevendo a seus pais Vítor
Fernando Stocco e Lúcia Regina Romano Stocco, o adolescente descreveu o socorro
que recebeu (9):
Entre o abatimento e o sono, vi que um senhor de idade madura me
abraçou e disse:
- Não se aflija. Sou seu "bi"e aqui me encontro para
cooperar com o papai e a mãezinha.
Eu não tinha intimidade com ninguém que pudesse se apresentar naquela
condição. Quase balbuciando as palavras indaguei sobre que
"bi", e ele me respondeu:
- Sou seu bisavô Vítor e vim convidar você para o repouso.
Aí, carregou-me nos braços foi quando falei àquele parente.
- Sou também Vítor e desejo a sua paz.
Aquele "bi" era o bisavô paterno, Nicanor Vítor Stocco,
desencarnado, que veio em auxilio ao bisneto nos umbrais do além.
Uma estória
JÓIAS DEVOLVIDAS
Existe uma palavra-chave para enfrentarmos com serenidade e equilíbrio
a morte de um ente querido: submissão.
Ela exprime a disposição de aceitar o inevitável, considerando que,
acima dos desejos humanos, prevalece a vontade soberana de Deus, que nos
oferece a experiência da morte em favor do aprimoramento de nossa vida.
A esse propósito, oportuno recordar antiga história oriental sobre um
rabi, pregador religioso judeu que vivia muito feliz com sua virtuosa esposa e
dois filhos admiráveis, rapazes inteligentes e ativos, amorosos e disciplinados.
Por força de suas atividades, certa vez o rabi ausentou-se por vários
dias, em longa viagem. Nesse ínterim, um grave acidente provocou a morte
dos dois moços.
Podemos imaginar a dor daquela mãe!... Não obstante, era uma mulher
forte. Apoiada na fé e na inabalável confiança em Deus, suportou
valorosamente o impacto. Sua preocupação maior era o marido. Como
transmitir-lhe a terrível notícia?!... Temia que uma comoção forte tivesse
funestas consequências, porquanto ele era portador de perigosa insuficiência cardíaca.
Orou muito, implorando a Deus uma inspiração. O Senhor não a deixou sem
resposta...
Passados alguns dias o rabi retornou ao lar. Chegou à tarde,
cansado após longa viagem, mas muito feliz. Abraçou carinhosamente a
esposa e foi logo perguntando pelos filhos...
- Não se preocupe, meu querido. Eles virão depois. Vá
banhar-se, enquanto preparo o lanche.
Pouco depois, sentados à mesa, permutavam comentários do cotidiano,
naquele doce enlevo de cônjuges amorosos, após breve separação.
- E os meninos? Estão demorando!...
- Deixe os filhos... Quero que você me ajude a resolver grave
problema...
- O que aconteceu? Notei que você está abatida!... Fale!
Resolveremos juntos, com a ajuda de Deus!...
- Quando você viajou, um amigo nosso procurou-me e confiou à minha
guarda duas joias de incalculável valor. São extraordinariamente
preciosas! Nunca vi nada igual! O problema é esse: ele vem
buscá-las e não estou com disposição para efetuar a devolução.
- Que é isso, mulher! Estou estranhando seu comportamento!
Você nunca cultivou vaidades!...
- É que jamais vira joias assim. São divinas, maravilhosas!...
- Mas não lhe pertencem...
- Não consigo aceitar a perspectiva de perdê-las!...
- Ninguém perde o que não possui. Retê-las equivaleria a roubo!
- Ajude-me!...
- Claro que o farei. Iremos juntos devolvê-las, hoje mesmo!
- Pois bem, meu querido, seja feita sua vontade. O tesouro será
devolvido. Na verdade isso já foi feito. As joias eram
nossos filhos. Deus, que no-los concedeu por empréstimo, à nossa guarda,
veio buscá-los!...
O rabi compreendeu a mensagem e, embora experimentando a angústia que
aquela separação lhe impunha, superou reações mais fortes, passíveis de
prejudicá-lo.
Marido e mulher abraçaram-se emocionados, misturando lágrimas que se
derramavam por suas faces mansamente, sem burburinhos de revolta ou desespero,
e pronunciaram, em uníssono, as santas palavras de Jó:
,, Deus deu, Deus tirou. Bendito seja o Seu santo nome."
Fonte:
Curso Básico de Espiritismo – Editora Aliança
Nossa Vida no Além – Marlene Nobre
Quem tem medo da morte? – Richard Simonetti
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