Toda vez que alguém ou algo se choque com o
bem-estar de outra pessoa, com o seu prazer, irá imediatamente produzir a chispa da
raiva. Esta poderá abrandar-se logo ou atear incêndio, dependendo da área que
tenha atingido.
A raiva é a reação emocional imediata à sensação
de se estar sendo ameaçado, sendo que esta ameaça possa produzir algum tipo de
dano ou prejuízo.
Não há quem já não tenha sido vítima da raiva.
Todos os dias nos deparamos com diversas pessoas, no trabalho, no trânsito, nas
conversações cotidianas... sendo estas as mais diversas, portadoras dos mais
variados estados de ânimo. Não raro, alguma palavra mal empregada, algum tom de
voz equivocado, e então nos sentimos ofendidos, tendo a raiva como reação imediata.
Sentir raiva é atitude natural e normal no
quadro das experiências terrenas. Canalizá-la bem, elucidando-a até a sua
diluição, é característica de ser saudável e lúcido, conforme assevera a
benfeitora espiritual Joanna de Ângelis. Mas como impedir que esta sensação
inquietante se alastre e não ocupe mais espaços na nossa mente e sentimentos?
Segundo a nobre mentora de Divaldo Franco, o
primeiro passo a ser dado é a aceitação de se estar sentindo raiva. Não há
motivos para nos envergonharmos da raiva e do fato de senti-la. Camuflá-la
perante atitudes de falsa humildade e santificação são atitudes de quem ilude a
si próprio, optando pelo parecer em detrimento do ser.
Em seguida devemos nos indagar: ”Por
que fiquei tão bravo ou brava com a atitude daquela pessoa? Por que me deixei
atingir tanto? O que esta pessoa fez de tão desagradável a ponto de conseguir
me desequilibrar o restante do dia?” Neste momento inicia-se a racionalização da
raiva, e então é que percebemos que nós mesmos tivemos uma participação ativa
na sua elaboração. Não foi o outro que produziu raiva em mim,
pois somos nós que estamos sentindo raiva, logo nós mesmos a
produzimos. Está em nós a sua origem e não no exterior.
Como dissemos, a raiva é uma reação emocional
que ocorre toda vez que alguém vai de encontro ao nosso bem-estar, de maneira
que nos sentimos ameaçados. O que então nos deixou tão ameaçados? Que
área do meu ser aquela palavra proferida pelo ofensor atingiu de maneira tão
precisa? Por que aquilo que foi dito significou tanto para nós?
A partir desse momento nós começamos a perceber
que na verdade a sensação de inferioridade ou de ofensa não
foi produzida pelo outro, ela já existia dentro de nós. Seria
como se a palavra empregada fosse a chave certa para uma determinada ideia
existente dentro de nós mesmos – ela já estava ali – bastava
acioná-la.
Decorre daí o enunciado de Joanna de Ângelis,
de que “a raiva é o lançamento de uma cortina de fumaça sobre nossos próprios
defeitos, a fim de que eles não sejam percebidos pelos outros”, sendo que
quanto maior for o complexo de inferioridade da pessoa, mais vulnerável ela
será a tudo o que for direcionado a ela do mundo exterior.
Canalizar bem a raiva significa, assim,
refletir sobre o porquê de nosso desequilíbrio momentâneo. Da mesma forma,
outro recurso deve ser empregado: refletir sobre a origem do ato na outra
pessoa. Isso significa perceber que a pessoa estava em desarmonia no momento em
que agiu de forma impensada, produzindo o conflito. Significa tentar perceber
que o outro agiu sem nenhuma intenção de produzir o dano que nós agora
sentimos.
Isso não significa, de maneira alguma, que
devamos ser coniventes com o desrespeito e ironia das pessoas ao nosso redor,
as quais agem sem pensar nas consequências de seus atos. Mostrar-se ofendido,
mostrar-se desgostoso com a situação, demonstrar os sentimentos de contrariedade
e até mesmo a raiva inerente à ofensa são reações perfeitamente normais, de
quem respeita a si mesmo e se considera credor do respeito e consideração dos
seus semelhantes. Da mesma forma, dar uma corrida, realizar exercícios físicos
ou algum trabalho que leve à exaustão, são recursos valiosos para se diluir a
raiva. Extravasar, contar para os amigos como se sente, também são atitudes
saudáveis e terapêuticas. O que não se deve fazer é camufla-la, reprimi-la,
pois então estaremos oportunizando o surgimento da mágoa e
do ressentimento.
Certamente há situações em que a dor nos atinge
sem que possamos nos defender. Ocorrências em que ficamos paralisados, sem
saber como agir, tamanha nossa surpresa e decepção. Entretanto, parece que
nunca estamos preparados para as decepções. Acreditamos que sempre seremos
estimados e considerados por todos, e que as pessoas nunca irão nos trair
– e então nos magoamos.
A ingratidão e a calúnia ainda fazem parte
do orçamento moral da humanidade, e não há quem não se depare
com elas em algum momento. Dependendo da pessoa autora do disparo, do
lançamento do dardo, este parece penetrar o mais profundo da alma,
produzindo enorme sofrimento. Muitas vezes, aquela pessoa em quem nós mais
confiávamos nos trai, nos decepciona, nos fere – e a dor então é perfeitamente
natural. Chorar, considerar a ocorrência injusta, demonstrar os sentimentos ao
agressor, mostrando-lhe os ferimentos, são atitudes que auxiliam
para que a dor diminua e se abrande. Contar aos amigos o ocorrido, demonstrando
como se sentiu diante da situação, dizer o quê o magoou, são
recursos que colaboram para que a mágoa não se instale na criatura.
Em nenhum momento devemos nos permitir guardar
a mágoa, diz o espírito Hammed. Quando a mágoa se instala, o indivíduo
vai perdendo aos poucos a alegria de viver, avançando em direção aos estados
depressivos e de melancolia – extinguindo-se o prazer pela vida. A mágoa
cultivada aloja-se em determinado órgão e o desvitaliza, alterando o
funcionamento normal das células. Quando dissimulada e agasalhada nas
profundezas da alma, se volta contra o próprio indivíduo, em um processo de
autopunição inconsciente. Neste caso, o indivíduo passa a considerar a si
próprio culpado pelo ocorrido, e então se pune, a fim de expiar a sua culpa.
Segundo Sigmund Freud, o grande psicanalista do
século vinte, todos nós temos uma certa predisposição orgânica para cedermos à
somatização de algum conflito. Esta se dá geralmente em algum órgão específico.
Desta forma, muitos de nossos adoecimentos repentinos são
frutos do que ele chamou de complacência somática. Nós guardamos a
mágoa ou “fazemos de conta” que ela não existe. Como os sentimentos não
morrem, eles são drenados no próprio ser, ferindo aquele que lhe deu
abrigo.
Mais uma vez, assevera Joanna de Ângelis,
devemos recorrer à racionalização do ocorrido. Refletirmos sobre o
desequilíbrio da outra pessoa, sobre sua insensatez e situação infeliz, o que
faz com que a mágoa vá perdendo terreno para a compreensão e impedindo que o
acontecimento venha a repetir-se continuamente na mente da criatura através
do ressentimento.
O ressentimento é o produto direto da repressão
da raiva. Não expressamos nossos sentimentos ao ofensor, não lhe demonstramos
nosso desapontamento e desgosto e então passamos a guardá-la, a fim de
desferi-la no momento oportuno.
O ressentimento é fruto de nosso atraso moral.
Nós guardamos a dor da ofensa a fim de esperar o momento oportuno da vingança,
do revide, a fim de sobrepormos nosso ego ferido em relação ao
ego do ofensor. Quando isto acontece, um sentimento de animosidade cresce dentro
de nós a cada dia, até que a convivência com a outra pessoa se torne
insuportável. Um olhar não suporta mais o outro e a relação cessa por completo.
Muitas amizades terminam assim, por falta de diálogo, de sinceridade e
humildade em reconhecermos para o outro que ficamos chateados com sua atitude.
Casais acumulam memórias de brigas, guardando lembranças de atritos que já
ocorreram há meses, sem trocarem sequer uma palavra sobre o assunto, criando um
clima silencioso o qual vai tornando o ressentido amargo e infeliz. Assim, há
pessoas que possuem sobre o olhar uma “máscara espessa”... que encobre qualquer
sorriso...Chegam a nos causar quase medo! É a amargura... que vai retirando
toda a alegria de viver da pessoa.
Nós devemos reagir imediatamente ao
ressentimento, impedindo o seu desdobramento. Sem dúvida que existem pessoas
que se comprazem na calúnia, em proferir ofensas e mentiras sobre toda e
qualquer pessoa. Não devemos sintonizar com este tipo de faixa vibratória e aceitar-lhes
os dardos infamantes.
Quando optamos por não guardar ressentimentos
estamos fazendo um bem a nós mesmos, impedindo a desarmonia e inquietação
decorrentes da sua instalação nos painéis das emotividades. O outro, porque em
desequilíbrio, receberá os frutos de suas ações, decorrente da faixa em que se
encontra.
A causa destes algozes da alma humana, tais
como a raiva, a mágoa e o ressentimento, quase sempre é a mesma: a falta de autoestima
da criatura, ou seja, a falta de amor por si mesmo. Quando valorizamos em
demasia o olhar de amigos, colegas e familiares, estamos nos apoiando em
terreno movediço. Nos tornamos apegados e dependentes.
Por outro lado, quanto mais nos descobrimos, quanto
mais passamos a desenvolver nossas potencialidades, reconhecendo nossos valores
e nossa beleza única, mais seguros nos tornamos, de maneira que a raiva e a
mágoa não encontram alicerces para sua instalação.
Aquele que se ama e valoriza não se magoa facilmente
e tampouco fica irado com qualquer palavra descabida de um colega de trabalho
ou amigo. Dessa forma, trabalhar pelo desenvolvimento de nossa autoestima é o
melhor antídoto para evitarmos o acúmulo do lixo mental dos ressentimentos e
mágoas.
Na origem de nossos males – por mais
que insistamos em culpar os outros -, sempre está à própria criatura,
herdeira de si mesma.
§ Bibliografia:
Joanna de Ângelis, em
“Autodescobrimento – Uma busca Interior”.
__”O Ser Consciente”
__”Amor, Imbatível Amor”
__”Elucidações
Psicológicas à Luz do Espiritismo”
__” Episódios
Diários”
Hammed, em “As Dores
da Alma”.
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