Quando
alguém tiver um filho contumaz e rebelde, que não obedecer à voz de seu pai e à
voz de sua mãe, e, castigando-o eles, lhes não der ouvidos, Então seu pai e sua
mãe pegarão nele, e o levarão aos anciãos da sua cidade, e à porta do seu
lugar; E dirão aos anciãos da cidade: Este nosso filho é rebelde e contumaz,
não dá ouvidos à nossa voz; é um comilão e um beberrão. Então todos os homens
da sua cidade o apedrejarão, até que morra; e tirarás o mal do meio de ti, e
todo o Israel ouvirá e temerá. (Deuteronômio 21:18-21)
“Uma
sociedade depravada certamente precisa de leis severas. Infelizmente, essas
leis mais se destinam a punir o mal depois de feito, do que a lhe secar a
fonte. Só a educação poderá reformar os homens, que, então, não precisarão mais
de leis tão rigorosas.” (Resposta à questão 796 em "O Livro dos
Espíritos", Allan Kardec)
A
questão da redução da maioridade penal tem diversas perspectivas possíveis:
A perspectiva do cidadão que com razão não se sente seguro com a escalada da violência alimentada por fluxo de jovens precocemente educados no crime;
A da justiça, que é obrigada a lidar com milhares de processos criminais de jovens envolvidos com a criminalidade;
A das mães e famílias dos jovens em ligação com o crime desde cedo, e que também têm a tarefa de zelar pela educação desses jovens;
A do Estado, que executa e é obrigado a definir políticas públicas para reduzir ou controlar a violência crescente, bem como prover educação apropriada aos jovens criminosos;
A perspectiva do cidadão que com razão não se sente seguro com a escalada da violência alimentada por fluxo de jovens precocemente educados no crime;
A da justiça, que é obrigada a lidar com milhares de processos criminais de jovens envolvidos com a criminalidade;
A das mães e famílias dos jovens em ligação com o crime desde cedo, e que também têm a tarefa de zelar pela educação desses jovens;
A do Estado, que executa e é obrigado a definir políticas públicas para reduzir ou controlar a violência crescente, bem como prover educação apropriada aos jovens criminosos;
A
perspectiva do próprio jovem criminoso que, conforme suas tendências internas e
situações a que for exposto, talvez deixe de ser um criminoso, mas fatalmente
deixará de ser jovem e terá que lidar com o estigma de ter sido classificado
como criminoso um dia.
A polarização se explica pela disputam de prioridade entre cada uma dessas perspectivas que são representadas por diversos grupos na sociedade. Mas, qual delas é a mais relevante? Faz sentido definir uma como mais relevante? Por que uma seria mais prioritária sobre a outra? Ainda assim, cada uma dessas perspectivas têm detalhes que nos parecem ainda mais complexos. Por exemplo: há indivíduos que amadurecem precocemente, enquanto outros nunca amadurecem. Do ponto de vista das ciências psicológicas, até que ponto seria possível determinar o grau de maturidade de um adolescente ou criança e, conforme esse grau, definir medidas educacionais versus punições mais apropriadas? Qual seria o impacto da adoção de uma redução na maioridade na mente infantil precocemente ligada ao crime?
A polarização se explica pela disputam de prioridade entre cada uma dessas perspectivas que são representadas por diversos grupos na sociedade. Mas, qual delas é a mais relevante? Faz sentido definir uma como mais relevante? Por que uma seria mais prioritária sobre a outra? Ainda assim, cada uma dessas perspectivas têm detalhes que nos parecem ainda mais complexos. Por exemplo: há indivíduos que amadurecem precocemente, enquanto outros nunca amadurecem. Do ponto de vista das ciências psicológicas, até que ponto seria possível determinar o grau de maturidade de um adolescente ou criança e, conforme esse grau, definir medidas educacionais versus punições mais apropriadas? Qual seria o impacto da adoção de uma redução na maioridade na mente infantil precocemente ligada ao crime?
Tais
são as questões que devem ser respondidas antes que possamos nos posicionar.
Além dessas, há o problema de usar princípios ou fundamentos de religiões ou
doutrinas filosóficas para decidir a questão. Esse seria um outro ponto de
vista ou perspectiva possível na lista acima. Por exemplo, religiões que aceitam
a tradição literal do Velho Testamento podem entender que a morte ou sacrifício
de menores são atos naturais e concebíveis segundo a concepção de Deus que se
encontram nesses textos. Um exemplo que nos parece abominável hoje é o
sacrifício do filho de Isaque em Gênesis 22:2 (1):
E disse: Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi.
E disse: Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá, e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi.
Ou,
o que dizer de Deuteronômio 21:18-21 citado no início deste texto? O que
esperar de doutrinas que acreditam piamente nessa noção de justiça divinamente
inspirada? Hoje, mais do que nunca, é estranho ouvir falar de grupos religiosos
que se movimentam para vetar ou propor leis conforme a crença que esposem. Como
se acham investidos de poder divino, acreditam que a divindade fala por eles e
assim determina que suas regras sejam impostas à sociedade.
Com
o esclarecimento dos povos (desenvolvimento científico, técnico e moral), religião
e sociedade apartaram-se. Leis se apresentam como expressões de consenso da
sociedade em uma determina época, seus valores, aspirações e crenças
momentâneas de como cada indivíduo deve se comportar e de quais seriam os
direitos correspondentes aos deveres. A tarefa da religião a partir de agora é
melhorar os homens para que eles, por sua vez, melhorem suas leis. Assim,
quanto mais evoluída for uma religião ou sistema de crença, tanto maior será o
efeito benéfico que trará à sociedade, pela educação (essa sim induzida por
crenças superiores) de seus seguidores.
O
objetivo desses post é apresentar alguns desses valores e crenças esposados
pela Doutrina Espírita que considero relevantes para o posicionamento do
espírita ante a mudança nas leis que regulam a maioridade penal. A referência
fundamental é "O Livro dos Espíritos" complementado pelo
"Evangelho Segundo o Espiritismo". Importante ressaltar: o que foi
explicado nessas obras sobre a justiça, a governar a relação entre os
encarnados, pode ser dividida em duas componentes: a "lei natural" -
sempre presente e a "lei humana" condicionada ao estado de sociedade.
Ao Espiritismo coube a tarefa de elucidar aspectos da lei natural.
Não
cabe aqui estabelecer uma posição espírita para a questão da redução da maioridade
penal (2), já que isso seria contrariar o que afirmamos acima. Que o leitor julgue
por si, com base em possíveis motivos já listados (3), favoráveis ou contrários
à redução da maioridade penal.
Começamos
pelo começo: a regra áurea.
Em
"O Livro dos Espíritos", a justiça a que um encarnado está sujeito é
regulada pela "lei natural" e pela "lei humana" (ver
subquestão (a) da questão # 875). Os questionamentos feitos por Kardec dizem
respeito, portanto, apenas à lei natural, já que a lei humana é específica
conforme a sociedade. Assim, no que diz respeito a essa lei, a diretriz máxima
está exposta na questão #876 "Queira cada um para os outros o que quereria
para si mesmo". A questão # 877 complementa a anterior com relação ao
primeiro dever que é "respeitar os direitos de seus semelhantes".
O
direito mais fundamental do homem e a missão da paternidade
Ainda
segundo a lei natural, explicam os Espíritos na questão # 880, o primeiro de todos
os direitos naturais do homem: “O de viver. Por isso é que ninguém tem o de
atentar contra a vida de seu semelhante, nem de fazer o que quer que possa comprometer-lhe
a existência corporal.”
A
esfera de ação da sociedade no encaminhamento da criança e do adolescente (segundo
a lei natural) está toda sob a tutela da paternidade. Aqui encontramos o campo
de maior efeito sobre os atos das crianças. Por causa disso, a questão 582 (na
II Parte, Capítulo X) qualifica a paternidade e maternidade como uma missão:
582. Pode-se considerar como missão a paternidade?
“É, sem contradita possível, uma verdadeira missão. Constitui ao mesmo tempo grandíssimo dever, que empenha, mais do que o pensa o homem, a sua responsabilidade quanto ao futuro. Deus colocou o filho sob a tutela dos pais, a fim de que estes o dirijam pela senda do bem, e lhes facilitou a tarefa dando àquele uma organização física débil e delicada, que o torna propício a todas as impressões. Muitos há, no entanto, que mais cuidam de endireitar as árvores do seu jardim e de fazê-las dar bons frutos em abundância, do que de endireitar o caráter de seu filho. Se este vier a sucumbir por culpa deles, suportarão os desgostos resultantes dessa queda e partilharão dos sofrimentos do filho na vida futura, por não terem feito o que lhes estava ao alcance para que ele avançasse na estrada do bem.”
582. Pode-se considerar como missão a paternidade?
“É, sem contradita possível, uma verdadeira missão. Constitui ao mesmo tempo grandíssimo dever, que empenha, mais do que o pensa o homem, a sua responsabilidade quanto ao futuro. Deus colocou o filho sob a tutela dos pais, a fim de que estes o dirijam pela senda do bem, e lhes facilitou a tarefa dando àquele uma organização física débil e delicada, que o torna propício a todas as impressões. Muitos há, no entanto, que mais cuidam de endireitar as árvores do seu jardim e de fazê-las dar bons frutos em abundância, do que de endireitar o caráter de seu filho. Se este vier a sucumbir por culpa deles, suportarão os desgostos resultantes dessa queda e partilharão dos sofrimentos do filho na vida futura, por não terem feito o que lhes estava ao alcance para que ele avançasse na estrada do bem.”
Portanto,
segundo a lei natural, a educação dos filhos é de responsabilidade dos pais. É
pela falta ou ausência desses, porém, que a criminalidade infantil pode se
tornar um problema da sociedade (como condições necessárias, mas não
suficientes, para manifestação dessa criminalidade). Ainda no segundo essa
responsabilidade natural, a justiça verdadeira, quando outro é o caso, é
ressaltada na questão seguinte:
583. São responsáveis os pais pelo transviamento de um filho que envereda pelo caminho do mal, apesar dos cuidados que lhe dispensaram?
“Não; porém, quanto piores forem as propensões do filho, tanto mais pesada é a tarefa e tanto maior o mérito dos pais, se conseguirem desviá-lo do mau caminho.”
Indiretamente a resposta implica a existência de Espíritos rebeldes, precocemente ligados ao mal e que, provavelmente, poderão reincidir em delinquência, se limites não forem estabelecidos a partir do lar.
583. São responsáveis os pais pelo transviamento de um filho que envereda pelo caminho do mal, apesar dos cuidados que lhe dispensaram?
“Não; porém, quanto piores forem as propensões do filho, tanto mais pesada é a tarefa e tanto maior o mérito dos pais, se conseguirem desviá-lo do mau caminho.”
Indiretamente a resposta implica a existência de Espíritos rebeldes, precocemente ligados ao mal e que, provavelmente, poderão reincidir em delinquência, se limites não forem estabelecidos a partir do lar.
Evolução
do direito e justiça.
Finalmente,
não deixa de ser elucidativa a questão # 796 que aparece na III Parte do
Capítulo VIII do "Livro dos Espíritos":
796. No estado atual da sociedade, a severidade das leis penais não constitui uma necessidade?
796. No estado atual da sociedade, a severidade das leis penais não constitui uma necessidade?
“Uma
sociedade depravada certamente precisa de leis severas. Infelizmente, essas
leis mais se destinam a punir o mal depois de feito, do que a lhe secar a
fonte. Só a educação poderá reformar os homens, que, então, não precisarão mais
de leis tão rigorosas.”
Essa resposta explica duas coisas: o estado anterior da lei humana e o foco que se deve buscar - segundo os Espíritos - no desenvolvimento das leis futuras. Deixa claro que apenas a educação é capaz de modificar os homens, de forma de forma a se dispensar o rigor das leis no futuro.
Essa resposta explica duas coisas: o estado anterior da lei humana e o foco que se deve buscar - segundo os Espíritos - no desenvolvimento das leis futuras. Deixa claro que apenas a educação é capaz de modificar os homens, de forma de forma a se dispensar o rigor das leis no futuro.
Finalmente,
a multiplicidade de pontos de vista (como apresentados no início deste post e
que é a causa de polêmicas infindáveis como a da redução da maioridade penal)
já teve sua causa explicada pela questão #974:
874. Sendo a justiça uma lei da Natureza, como se explica que os homens a entendam de modos tão diferentes, considerando uns justo o que a outros parece injusto?
“É porque a esse sentimento se misturam paixões que o alteram, como sucede à maior parte dos outros sentimentos naturais, fazendo que os homens vejam as coisas por um prisma falso.”
874. Sendo a justiça uma lei da Natureza, como se explica que os homens a entendam de modos tão diferentes, considerando uns justo o que a outros parece injusto?
“É porque a esse sentimento se misturam paixões que o alteram, como sucede à maior parte dos outros sentimentos naturais, fazendo que os homens vejam as coisas por um prisma falso.”
Conclusão
O
comentário da questão 796 nos deixa tranquilos quanto ao ponto fundamental
apresentado pelos Espíritos para o abrandamento das leis humanas. Trata-se
porém de uma resposta geral que explica porque as leis humanas anteriores (como
no caso do Deuteronômio) eram tão severas. A que distância chegamos com o
ensino dos Espíritos em comparação com aquelas regras, que hoje parecem tão
ultrapassadas!
Nos
tempos modernos, não compete mais a nenhuma religião ou doutrina alterar leis
humanas. Isso acontecia no passado por força da importância que a religião
tinha dentro do Estado e vice-versa. No caso do Espiritismo, as respostas dadas
pelos Espíritos dizem respeito à lei natural e sua justiça e não poderão ser
extrapoladas nem copiadas para a lei humana que, por causa de suas inúmeras
necessidades adicionais, é bem diferente da regra natural. No máximo o estudo e
a convicção da lei natural poderá mostrar aos encarnados o estado em que se encontrarão
no futuro, caso se desvirtuem dessa lei. Então, tal como os homens que bem planejam
o futuro, os encarnados poderão viver melhor em sociedade. Que essa justiça natural
existe e é operante é assunto para outro post.
Ainda
assim, o espírita que quiser contribuir para o debate sobre a redução da maioridade
penal não deve se esquecer da importância da educação infantil, da missão da
paternidade, da necessidade de aprimorar nosso conhecimento sobre a psicologia
humana, da existência no mal no coração de mentes perversas recém encarnadas e
da infinita capacidade do amor no resgate desses corações desviados.
Referências
e notas.
(1)
O Deus do Velho Testamento parece ter predileção pela morte de crianças. Ver
não só Gênesis 22:2, mas também: Êxodo 4:23, Êxodo 11:5, Êxodo 12:29, Números
31:17, Oséas 13:16, I Samuel 15:3, Salmos 135:8, Salmos 137:9, Levíticos 26:29,
Isaías 13:16, Jeremias 11:22 dentre outros versos bíblicos. (referência:
https://www.bibliaonline.com.br/)
(2)
M. Milani (2015). Redução da maioridade penal: há espíritas a favor e contra.
Blog Educador Espírita.
(2)
Sobre pontos favoráveis e contrários:
https://acidblacknerd. wordpress.com/2013/04/25/euvi-reducao-da-maiorida-penal10-motivos-para-ser-a-favor-10-motivos-para-ser-contra/
https://acidblacknerd. wordpress.com/2013/04/25/euvi-reducao-da-maiorida-penal10-motivos-para-ser-a-favor-10-motivos-para-ser-contra/
FONTE:
http://eradoespirito.blogspot.com.br/2015/04/reducao-da-maioridade-penal-e.html
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