segunda-feira, 6 de abril de 2015

A Preocupação com a Morte




Capítulo II – O Céu e o Inferno


Causas da preocupação com a morte - Porque os espíritas não se preocupam com a morte –


1 — O homem, em qualquer situação social, desde o estado de selvageria, tem o pressentimento inato do futuro. Sua intuição lhe diz que a morte não é a última fase da existência e que aqueles que choramos não estão perdidos para sempre. A crença no futuro é intuitiva e infinitamente mais generalizada que a ideia do nada. Como se explica, entretanto, que entre os que acreditam na imortalidade da alma ainda se encontre tamanho apego às coisas terrenas e tão grande preocupação com a morte?(6)
2 — A preocupação com a morte é determinada pela sabedoria da Providência e uma consequência do instinto de conservação comum a todos os seres vivos. É necessária, enquanto o homem não estiver esclarecido a respeito da vida futura, como um contrapeso ao arrastamento que, sem esse freio o levaria a deixar prematuramente a vida terrena e a negligenciar o seu trabalho neste mundo, que deve servir para o seu próprio adiantamento.
É por isso que, entre os povos primitivos, o futuro aparece apenas como vaga intuição, tornando-se mais tarde uma simples esperança, e finalmente se transformando em certeza, mas ainda assim contrabalançada por um secreto apego à vida corporal.
3 — A medida em que o homem compreende melhor a vida futura a preocupação com a morte diminui. Mas, ao mesmo tempo, compreendendo melhor a sua missão na Terra ele espera o seu fim com mais calma, resignação e sem medo. A certeza da vida futura dá novo curso às suas ideias e outra finalidade aos seus trabalhos. Antes de ter essa certeza ele só trabalha com vistas à vida presente. Com essa certeza ele trabalha com vistas ao futuro sem negligenciar o presente, porque sabe que seu futuro depende da orientação mais ou menos boa que der ao presente. A certeza de reencontrar seus amigos após a morte, de continuar as relações que tinha na Terra, de não perder o fruto de nenhum de seus trabalhos, de crescer sem cessar em inteligência e perfeição, lhe dá a paciência de esperar e a coragem de suportar as fadigas passageiras da vida terrena. A solidariedade que ele descobre entre os vivos e os mortos lhe faz compreender a que deve existir entre os vivos e desde então a fraternidade revela a sua razão de ser e a caridade o seu objetivo no presente e no futuro.
4 — Para escapar às preocupações com a morte ele precisava encarar a esta no seu verdadeiro sentido, quer dizer, penetrar pelo pensamento no mundo espiritual e fazer sobre ele uma ideia tão exata quanto possível, o que denota no espírito encarnado um certo desenvolvimento e uma certa aptidão para se libertar da matéria. Para os que não estão suficientemente adiantados a vida material ainda se sobrepõe à vida espiritual.
Apegando-se ao exterior, o homem só vê a vida do corpo, quando a vida real é a da alma. O corpo estando privado de vida, tudo lhe parece perdido e ele se desespera. Se, em lugar de concentrar o seu pensamento nas vestes exteriores, ele o dirigisse para a verdadeira fonte da vida, para a alma, ser real que sobrevive a tudo, lamentaria menos o corpo, fonte de tantas misérias e dores. Mas para isso necessita de uma força que o Espírito só adquire amadurecendo.
A preocupação com a morte está ligada à insuficiência de noções sobre a vida futura. Por isso, quanto mais ela se liga à necessidade de viver, mais aumenta o temor da destruição do corpo como o fim de tudo. Ela é assim provocada pelo secreto desejo de sobrevivência da alma, ainda velada pela incerteza.
A preocupação se enfraquece a medida que se desenvolve a certeza e desaparece por completo quando esta se firma.
Eis o lado providencial da questão. Seria prudente não perturbar o homem cuja razão ainda não esteja suficientemente forte para suportar a perspectiva demasiado positiva e sedutora de um futuro que poderia levá-lo a negligenciar o presente, necessário ao seu progresso material e intelectual.(7)
(6) A intuição inata da vida futura é um dos fatores básicos da origem das religiões. (N. do T.)
(7) A advertência de Kardec, neste pequeno trecho, exige a maior atenção do leitor. Muitas pessoas têm o anseio, justo mas imprudente, de converter todo mundo às suas crenças. O Espiritismo não tem necessidade de proselitismo. Kardec sempre acentuou que ele não veio para os que estão satisfeitos em sua crença ou descrença, mas para os que não o estão e procuram algo mais. Há pessoas que não se acham em condições de compreender os princípios espíritas.
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Allan Kardec.

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