segunda-feira, 28 de abril de 2014

DEVER CRISTÃO



Rossi e Alves eram diretores de conhecido templo espírita e davam-se muito bem na vida particular. Afinidade profunda.
Amizade recíproca. Sempre juntos nas boas obras, integravam-se perfeitamente no programa do bem.
Alves, com desapontamento, passou, a saber, que Rossi, nas três noites da semana sem atividades doutrinárias, era visto penetrando a porta de uma casa evidentemente suspeita, lugar tristemente adornado para encontros clandestinos de casais transviados.
Persistindo semelhante situação por mais de um mês, Alves, certa noite, informado de que o amigo entrara na casa referida, veio esperá-lo à saída. Dez, onze, meia-noite...
Minutos depois de zero hora, Rossi saiu calmo e o amigo abordou-o.
- Meu caro - advertiu Alves, sisudo, - não posso vê-lo reiteradamente neste lugar. Você é casado, pai de família e, além de tudo, carrega nos ombros a responsabilidade de mentor em nossa Casa.
Nada podemos condenar, mas você não ignora que álcool e entorpecentes, aí dentro, andam em bica...
Rossi coçou a cabeça num gesto característico e observou:
- Não há nada. Estou apenas cumprindo um dever cristão.
- Dever cristão?
- Sim, a filha de um dos meus melhores amigos está frequentando este círculo. Jovem inexperiente. Ave desprevenida em furna de lobos.
Enganada por lamentável explorador de meninas, acreditou nele...
Mas a batalha está quase ganha. Convidei-a a pensar. Há mais de um mês prossegue a luta. Hoje, porém, viu com os próprios olhos o logro de que é vítima. Acredito que amanhã surgirá renovada...
E, ante os olhos desconfiados do amigo:
- Você sabe. É preciso agir, sem rumor, sem escândalo. Quem sabe?
Talvez em futuro próximo a invigilante pequena possa encontrar companheiro digno. E ser mãe respeitada.
Alves riu-se às pampas, de maneira escarninha, e falou: - Vou ver!
- Não, não! Não vá! - pediu Rossi, em súplica ansiosa.
- Tem medo de ser apanhado em mentira? - disse Alves, com a suspeita no rosto. E, sem mais nem menos, entrou casa adentro, encontrando, num pequeno salão, sua própria filha chorando ao pé de um cavalheiro desconhecido...

Waldo Vieira

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