terça-feira, 24 de setembro de 2013

Colônias Espirituais

Um dos temas mais interessantes e complexos do Espiritismo é o das colônias espirituais. É um assunto que antecede o Espiritismo em milhares de anos, mas que ganhou uma amplitude inédita após as narrativas do livro “Nosso lar”.

O conceito de que nosso mundo é composto por várias e diferentes camadas de realidades não é novo. As mais antigas civilizações do planeta já se referiram a isso de diversas maneiras, com descrições que variavam de acordo com as crenças e as culturas que as elaboraram.

Da mesma forma, também foram diferentes as maneiras pelas quais as descrições de outros planos de existência chegaram até os encarnados: visões, revelações, sonhos, êxtases, encontros com entidades superiores, psicografias, canalizações. Os meios mudam, mas muitas vezes as descrições têm muito em comum.

No Espiritismo, as descrições das colônias espirituais – tais como a mais conhecidas de todas, “Nosso Lar” – têm lugar de destaque em muitas obras, sendo fornecidas pelos Espíritos para os médiuns.

O conhecido divulgador da Doutrina Espírita e autor Richard Simonetti concorda que essa realidade espiritual envolvendo colônias, cidades ou moradias, está presente nas informações prestadas por médiuns em todas as culturas.

Mas, ele diz, sempre de forma nebulosa e fantasiosa. Nunca de forma tão clara e precisa quantos nos ofereceu André Luiz, pela incomparável mediunidade de Chico Xavier.

Marcel Mariano, vice-presidente da FEEB (Federação Espírita do Estado da Bahia), também destaca a importância da obra “Nosso Lar” (1944, FEB). Ele diz que devemos entender as colônias espirituais como os aglomerados urbanos situados fora do plano material no qual se encontram os encarnados.

Esses núcleos estão para os espíritos desencarnados como as grandes cidades estão para nós. Sempre ouvimos essa ou aquela referência a essas colônias, até porque quem nelas esteve e morou quando na erraticidade traz vaga lembrança, desejoso de para ela voltar quando da desencarnação.

Alguns livros do século 19, de natureza mediúnica, já se referiam a tais adensamentos de seres desvestidos do corpo, mas foi tão somente com a obra de “Nosso Lar”, de autoria espiritual de André Luiz, pelo médium Chico Xavier, que o assunto ganhou uma dimensão doutrinária em nosso movimento.

Allan Kardec a elas se referiu sutilmente, conforme se pode observar pela questão proposta por ele aos Espíritos Codificadores, na questão 234 de “O Livro dos Espíritos”. O dirigente baiano também disse que existe diferença entre as colônias espirituais citadas no Espiritismo e cidades espirituais semelhantes mencionadas por outras doutrinas ou religiões.

A diferença existe, diz Mariano, e gira em torno do desdobramento, de onde esta se situa, e como funciona, o que foi feito magistralmente por André Luiz na obra já referida. As muitas citações deixam claro que elas existem, diferindo apenas pelo canal por onde vazam esses informes, que podem ser genéricos ou específicos.

Na questão 234 de “O Livro dos Espíritos”, à qual Marcel Mariano se referiu, Kardec pergunta se existem de fato mundos que servem de estações ou pontos de repouso aos Espíritos errantes. A resposta é que eles existem, mundos particularmente destinados aos seres errantes, mundos que podem servir-lhes de habitação temporária, campos nos quais possam descansar de uma erraticidade demasiada longa.

São, entre os outros mundos, posições intermediárias, graduadas de acordo com a natureza dos Espíritos que a elas podem ter acesso e onde eles gozam de maior ou menor bem-estar.

O pesquisador, escritor e médium Eurípedes Kuhl entende que pode haver alguma semelhança entre as cidades citadas pelo Espiritismo e aquelas, por exemplo, da Grande Fraternidade Branca. Não posso afirmar categoricamente que as colônias espirituais citadas na literatura espírita sejam as mesmas referidas em outras fontes, diz Kuhl.

No entanto, nada me objeta refletir e deduzir que sim, de alguma forma assemelham-se, em parte, como a citação de esferas (degraus) espirituais, na psicosfera terrena, nas quais habitam espíritos bons e maus.

As diferenças existentes decorrem da diversidade, não só da forma de expressão humana para registrar acontecimentos, quase sempre eivada de animismo, mas principalmente em razão da cultura dos diversos povos, ao longo da história, além dos fundamentos de cada corrente do pensamento religioso.

Via de regra proclamando existência terrena única e “juízo final”, ao passo que a Doutrina dos Espíritos, e não apenas ela, professa a reencarnação – vidas sucessivas – como forma individual (por merecimento) de alcançar o progresso moral e a felicidade.

Baseando-se no livro “Colônias Espirituais”, de Lúcia Loureiro, Eurípedes levanta exemplos na história de referência a colônias espirituais – também chamadas cidades ou moradas espirituais, entre outras designações.

Os Egípcios (por volta do ano 2100 A.C.) consideravam que os mortos seriam julgados diante de Osíris (deus do mundo infernal e juiz dos mortos); daí, os bons iriam para locais venturosos e os maus, para lugares tenebrosos, sem luz e sem alimentos, para sempre. Os Persas (1500 A.C.) proclamavam mais ou menos as mesmas condições dos egípcios, com a diferença de que no fim até os maus se salvariam.

Para os Gregos (500 a 400 A.C.), os bons – os deuses – estavam no Olimpo; quanto aos demais, após a morte haveria um julgamento presidido por “Hades” (um dos 12 deuses do Olimpo, senhor das profundezas subterrâneas, os infernos); os bons iriam para os “Campos Elíseos”, mansão dos bem-aventurados; os ímpios eram atirados ao “Tártaro” (lugar de expiação).

Sócrates e Platão filosofavam (intuíam) que as almas, após permanecerem por algum tempo no Hades, retornariam à vida terrena (antecedentes da reencarnação). Jesus declarou sumariamente a existência de “muitas moradas na Casa do meu Pai”.

Dante Alighieri (1265–1321), de acordo com o pensamento da idade Média, afirmou, na “Divina Comédia”, que na semana Santa do ano de 1300, desdobrou-se espiritualmente e, após atravessar os nove círculos do inferno, viu como é a vida no mundo do Além.

Emmanuel Swedenborg (1688-1772), sueco de grande cultura, precursor do Espiritismo, narrou ter recebido revelações espirituais. Numa delas, descreveu a visão que teve do mundo espiritual, citando, entre tantos detalhes, a existência de cidades, palácios, casas, livros, etc.

Eurípedes também se referiu ao fato de Kardec ter tocado levemente no tema das colônias ou cidades espirituais. Allan Kardec, de fato, foi econômico quanto a citações referentes a cidades espirituais, diz Kuhl, no entanto, relacionando ainda outra questão de “O Livro dos Espíritos”, a de número 86, na qual os Espíritos informam claramente que “... é incessante a correlação entre o mundo espírita (espiritual) e o mundo material.

Segundo Kuhl, infere-se daí que no plano espiritual há cidades e tudo o mais que temos aqui. “Sem pieguismos, minha ilação é que lá tem muito mais do que aqui.”

Posteriormente, segundo nos explica Eurípedes, Kardec deixou pequenas notas sobre habitações espirituais. Por exemplo, na “Revista Espírita”, de agosto de 1868, refere-se a cidades na espiritualidade, com comentários sobre habitações em Júpiter, com moradas e edifícios para varias finalidades. E em “O Céu e o Inferno”, registra o depoimento do Espírito da condessa Paula, dando conta das moradas aéreas, iluminadas por cores sublimes.

Para Simonetti, ainda que não existam descrições detalhadas sobre colônias espirituais na obra de Kardec, ele não ignorava sua existência, já que a condição gregária, isto é, a necessidade de conviver para evoluir, é uma característica  do espírito imortal. Não teria sentido imaginá-lo a viver de forma solitária na espiritualidade. Marcel Mariano entende que Kardec preocupou-se mais com a situação do Espírito no além do que como o lugar em que ele estava situado.

O presidente da Funtarso (operadora da Rádio Rio de Janeiro), Gerson Simões Monteiro, lembra que as revelações dos Espíritos Superiores à humanidade são graduais e, assim, em 1857 eles não poderiam falar de comunidades de Espíritos habitando cidades estruturadas em edificações de natureza sólida na atmosfera terrestre.

Quando estive pessoalmente com Chico Xavier em sua casa em Uberaba, nos idos de 1980, diz Gerson, ele me contou que quando estava psicografando o livro “Nosso Lar” foi tachado de “médium fascinado”. Ele mesmo estava meio confuso com toda aquela situação.

Certa noite, o Espírito André Luiz levou-o em desprendimento num ponto bem acima da cidade de “Nosso Lar”, para que ele visse de cima a cidade e pudesse constatar a realidade do que estava psicografando. E, nesse momento, esclareceu-me ainda que o que ele viu naquela noite está exatamente no mapa desenhado no livro “Cidade no Além, 1983” pela médium Heigorina Cunha.

Essa médium comprovou a existência da cidade em desdobramento espiritual durante o sono, explica Gerson Simões. Ao despertar no corpo, Heigorina desenhava o que via em suas visitas durante a emancipação de sua alma ao dormir, retratando jardins, avenidas, prédios e até a planta baixa da cidade, que abriga cerca de um milhão de espíritos desencarnados. Esses desenhos estão reunidos no livro “Cidade no Além”.

Com relação a essas colônias, lembra Eurípedes, deve-se considerar também que os Espíritos que habitam a espiritualidade são agrupados segundo o grau individual de evolução moral, sintonia, simpatias, objetivos, habilidades, tendências, hábitos, suas necessidades de aprendizado, de evolução moral. Assim, é de se imaginar que podem existir colônias espirituais que reúnam apenas determinados tipos de Espíritos. Podem existir até mesmo colônias “do mal”.

Espíritos trevosos, portanto infelizes, explica Kuhl, reunidos em falanges, constroem cidades no mundo espiritual, onde exercem tirania, subjugando incautos. Como por exemplo, citamos o capítulo II da obra “Libertação” (1949, FEB), do autor espiritual André Luiz, com psicografia de Chico Xavier.

Ainda, no capítulo XIV a impressionante descrição de uma cidade espiritual estranha, comandada por infortunado quanto poderoso governador: naquela cidade residem centenas de milhares de espíritos alienados e doentes. Construções no mundo espiritual, para o bem ou para o mal, obedecem ao manejo da vontade e do pensamento do espírito (O livro dos Médiuns, capítulo VIII e a Gênese, capítulo XIV, item 13).

Marcel Mariano segue pela mesma linha de raciocínio, lembrando a mesma obra “Libertação”, além de “Sexo e Obsessão” (Leal), de Manoel Miranda psicografado por Divaldo Franco:

“Entendemos, à luz dos ensinamentos espíritas, que os Espíritos formam colônias ou aglomerados de convivência no mais além, atraídos pela afinidade de propósitos, de sentimentos, o que nos leva a admitir a existência de colônias somente de suicidas, de sexólatras, de toxicômanos, e por aí vai. E, nessa linha de raciocínio, é igualmente admissível conceber cidades ou agrupamentos espirituais inteiramente dedicados ao mal”.

Gerson Simões Monteiro acredita que devam existir milhares de colônias em torno da Terra, cada uma reunindo Espíritos afins, de acordo com a raça, religião, cultura, progresso moral, etc. “Admitindo-se que em torno da Terra vivam cerca de 13 bilhões de Espíritos desencarnados, e dividindo por um milhão, tomando por base a população de “Nosso Lar”, teremos no mínimo 13 mil colônias espalhadas por toda a psicosfera terráquea”.

Um exemplo que fundamenta o ponto de vista de Gerson é o livro “Quando se pretende falar da vida” (1984, GEEM), citado por ele. Na obra, “o jovem de formação israelita Roberto Muszkat, desencarnado em 14 de março de 1979, enviou 22 mensagens pelo médium Chico Xavier, endereçadas aos seus pais e familiares. Na mensagem de 16 de novembro de 1979, relatando para a mãe o seu desligamento do corpo, ele fala da ajuda de seu avô, Moszek Aron, o qual, ao pronunciar as palavras “leshaná habaá bi-Yerushalayim”, tranqüilizou-o, fazendo com que dormisse como uma criança”.

Ao acordar, seu avô levou-o ao encontro de outros espíritos amigos e, numa reunião, teve a oportunidade de fazer muitas perguntas. Foi assim que ficou sabendo que estava em “Erets Israel” (Terra de Israel), ou Terra do Renascimento, uma província do espaço terrestre onde se erguia uma cidade luminosa dos profetas. Ele explicou ainda que não queria dizer que estava numa cidade privilegiada, uma vez que outras nações também possuem essas cidades nas esferas que cercam o planeta.

Richard Simonetti também fala em números altos ao imaginar a quantidade de colônias que podem existir no planeta. Se considerarmos, diz ele, consoante informações do médium Chico Xavier, que a população global do planeta é perto de 25 bilhões de espíritos em evolução e que estão encarnados aproximadamente 6 bilhões e 700 milhões, será fácil concluir que há incontáveis colônias nos vários níveis espirituais do planeta.

Para Eurípedes Kuhl, são tantas as citações sobre essas colônias que imagino inviável quantificá-las. Numa comparação tosca, da qual me penitencio, cito que apenas no Brasil temos mais de cinco mil Municípios, além de uma infinidade de pequenos povoados, muitos deles sem registro nos mapas.

E no mundo? E quanto à localização dessas colônias, Eurípedes entende que só pode se saber por dedução. Considerando-se notícias vindas do Plano Maior, parece-me que, na maioria dos casos, a cada cidade terrena há uma correspondente espiritual, situada logo acima da respectiva psicosfera.

Já Marcel Mariano entende que “toda informação que indique o lugar onde uma colônia está situada, quantos habitantes possui, quantas são e como é sua estrutura político- administrativa, é matéria de fé. Pode ser rejeitada. Ninguém é obrigado a aceitar como verdade uma informação somente porque ela é de origem mediúnica. Sob hipótese alguma vou lançar fora o bom senso que deve presidir meu senso crítico, como nos recomendou Kardec.

Posso aceitar essa ou aquela informação, mas não posso prová-las materialmente. É o caso de “Nosso Lar”, que aceitamos genericamente em nosso movimento por estar lastreada pela idoneidade moral de Chico, calcada numa vida ímpar, de abnegação e desinteresse levados ao extremo em favor do próximo. Exercitemos a liberdade de pensamento acima de tudo.

Com relação às provas materiais, Eurípedes Kuhl segue pelo mesmo caminho que Marcel Mariano, entendendo que elas não existem, mas ao mesmo tempo salientando que as provas espirituais são infinitas, com lastro na fé raciocinada. Algo assim como um sofisma, ele diz, que me permito: “nunca fui ao Japão, no entanto tenho certeza absoluta de que a sua capital é Tóquio”.

Simonetti lembra que a prova está no que Kardec chamava de universalidade dos ensinos. Se, por intermédio de vários médiuns confiáveis, diz Simonetti, recebemos notícias idênticas sobre o assunto, temos aí a evidência de que existem colônias espirituais. Obviamente, é uma prova para quem a aceita. Até hoje há quem não aceite as evidências de que os americanos foram à Lua e, na Inglaterra, há uma sociedade cujos membros não acreditam que a Terra é redonda.

Marcel Mariano lembra que fotos obtidas pelo sistema VIDICOM já estão trazendo aspectos de residências e de abrigos no mundo espiritual. Essa palavra foi criada pelo pesquisador Klaus Schreiber, ao que se sabe em 1985, quando ele idealizou um sistema de comunicação com o mundo dos espíritos ou transcomunicação instrumental, com vídeo.

Consistia basicamente numa câmera em um tripé filmando a tela de uma televisão, sintonizada num canal sem imagens. Ou seja, filmava-se o “chuvisco” e, posteriormente, o filme era passado em velocidades menores; em alguns casos, são detectadas imagens.
Aguardemos, diz Marcel, que esta área da ciência experimental avance um pouco mais e nos traga confirmação desses informes de natureza mediúnica, sobretudo pela psicografia. Até lá, poderemos até acreditar, mas somente saberemos com o aval da ciência.

Gerson Simões Monteiro lembra que, se Allan Kardec precisasse da confirmação da ciência sobre a existência da alma ou da reencarnação para publicar “O Livro dos Espíritos”, estaríamos esperando o pronunciamento oficial até hoje. Não podemos perder de vista o aspecto revelador do Espiritismo, ele explica, que se antecipou ao conhecimento humano a respeito da existência da alma, da reencarnação, até mesmo a do perispírito.

Um exemplo dessa antecipação propiciada pelo aspecto revelador do Espiritismo, segundo apresenta Gerson, é ocaso da existência de água no solo de Marte. Desde 1939, ele explica, o espírito “Humberto de Campos”, pelo médium Chico Xavier, no livro “Novas Mensagens”, fala dessa existência. No entanto, somente em 2004, ou seja, 65 anos após a publicação da obra, a NASA apresentou as primeiras provas químicas e geológicas diretas da existência de água no passado.

Agora, em 31 de julho de 2008, com a sonda Phoenix, o cientista William Boynton, da Universidade do Arizona, declarou que eles tinham evidência de gelo. Se para “tocar” em coisas materiais, a ciência humana levou mais de 60 anos, o que dirá para “tocar” coisas da dimensão espiritual, no caso, as colônias espirituais, como também chegar à conclusão de que a alma existe e que ela reencarna várias vezes?

É preciso lembrar que Allan Kardec, em “A Gênese”, ao tratar dos Caracteres da Revelação Espírita, esclarece: “A revelação Espírita, por sua natureza, tem uma dupla característica: é ao mesmo tempo uma revelação Divina e uma revelação científica”. Portanto, o ônus da prova das revelações feitas pelos Espiritismo cabe à ciência humana, e não ao Espiritismo”.




Gilberto Schoereder
Revista Espiritismo e Ciência

 

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